NO AR: OS OPERÁRIOS DA PALAVRA

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

De volta para minha terra - Maximiliane Veiga

- Passagem pra Capitão Leônidas Marques, por favor.

- Plataforma 5, portão B. O ônibus encosta 14h15 e sai às 14h30.

- Obrigada.

Rodoviária Municipal de Cascavel, sábado, 14 horas. No portão indicado pelo vendedor de passagens, um começo de alvoroço. Poucas pessoas que já começam a se entulhar no portão de embarque. Ainda falta meia hora para o ônibus sair, talvez hoje não vá lotado.

Engano.

14h15, portão lotado. Em 15 minutos as pessoas tomaram conta de toda a porta de vidro que separa a parte interna da rodoviária da plataforma de embarque. Não existe fila. Talvez exista, mas as pessoas ignoram. Mais de 40 passageiros a espera. No mesmo portão também encosta o ônibus que vai para Boa Vista da Aparecida. As duas lotações no mesmo horário causam transtorno, pois a maioria dos idosos se confunde no momento do embarque e acabam pegando a condução errada.

O motorista de sorriso leve e bem-humorado salta do veículo e vem em direção à porta. Ele vem abrir a porteira. A grande porteira de vidro que separa a boiada do pasto. Ao abrir o portão as pessoas correm, empurram umas as outras, sem se importar se há idosos ou crianças. O que importa é pegar um lugar dos 52 disponíveis. Depois de uma dose de luta livre, finalmente consigo entrar no metropolitano. O cobrador, com olhar duro e cansado recebe as passagens. Agora resta sentar no banco nada confortável que o pinga-pinga oferece e agradecer por tê-lo conseguido. Ainda restam 15 minutos no sol até o ônibus partir. O cheiro de cansaço paira no ar.

No ônibus há os bancos selecionados para idosos, gestantes e deficientes, mas o cartaz colado ao lado do assento passa despercebido aos olhares daqueles que fingem não ver. Entra uma senhora, com o rosto manchado e cansado. As pessoas disfarçam, ninguém quer ser obrigado a dar o lugar, nem mesmo aqueles que estão num banco reservado para essa senhora. Uma moça oferece o seu. Outro homem dá lugar a um idoso. Nenhum deles estava nos bancos “especiais”.

O senhor de olhar doce não quer preocupar o jovem:

- Não precisa não moço! Já viajei dez horas sentado, eu aguento fica de pé mais um pouco.

O jovem ignora, e cede o seu lugar.

Enquanto uns leem, ouvem música, conversam, outros estão ali só em corpo por que a mente aparenta estar longe, em outra dimensão.

14h33 e o Expresso Santa Tereza sai da plataforma 5. Mais de 15 pessoas estão em pé. O cobrador pula a roleta, os viajantes se ajeitam e se equilibram para não cair com o vai e vem do ônibus. O motorista acelera na Tancredo, é hora de viajar.

No fone de ouvido, Scorpions me distrai. Pessoas estranhas, diferentes. Todas indo para algum lugar, um lugar que só faz sentido para elas mesmas. O vento entra pela janela e ameniza o cheiro de suor. A próxima parada já é logo ali, é no Hospital Universitário. Lá é o primeiro dos diversos pontos que essa linha faz.

Quem está em pé se espreme. Com os 15 juntam-se mais sete e é só o primeiro ponto. 28 vagas para passageiros em pé, é o que diz o cartaz. Faltam apenas seis para atingir a capacidade total e o metropolitano nem saiu de Cascavel. Há pessoas emboladas ao lado do motorista. Aquilo que é normal ver em lotações do transporte público urbano também acontece nos ônibus metropolitanos que vão para as rodovias. O risco é grande. E a irresponsabilidade também. A polícia Rodoviária Federal, que tem um posto situado no município de Lindoeste, há 43 km de Cascavel, tem a obrigação de fiscalizar irregularidades nas rodovias, porém finge não ver os ônibus que passam lotados todos os dias, debaixo do seu nariz.

“Devagar motorista, parece que tá carregando porco”, grita uma senhora que, em pé, tem dificuldade em manter o equilíbrio.

“O problema é que só desembarca quem está de pé”, um senhor faz piada. Apesar do sufoco, o jeito é rir para não chorar. E olha que até dá vontade.

Mais uma parada. Mais passageiros. O ônibus se esforça para arrancar. Agora ele está lotado, sua capacidade está completa e ainda nem saiu de Cascavel. Pelo visto hoje a viagem será ainda mais longa. Os 80 km que ligam Cascavel a Capitão Leônidas Marques nunca pareceram tão distantes.

Texto de Maximiliane Veiga

Nenhum comentário:

Postar um comentário