Aos
quatro anos de idade, Lucas perdeu parte de suas forças, mas isso
não o derrubou e hoje ele está muito mais forte
Era para ser um dia
tranquilo no Bairro Julieta Bueno em Cascavel, mas o ano de 2004
ficou marcado na memória e no corpo do garotinho de apenas quatro
anos de idade. Lucas e a mãe, Lucilene, estavam no quintal, em
frente a casa onde moravam e escutaram alguns barulhos vindos da
esquina. De repente surgiram quatro homens com armas em punho e
começaram um tiroteio. A casa de Lucas ficou entre o fogo cruzado.
Durante a confusão um atirador ficou ferido e correu para dentro da
casa do menino. Escutou-se outro tiro e Lucas caiu. A bala era para o
homem que corria para dentro da casa, mas acertou a costela direita
do garoto.
A mãe ficou
desesperada. Os vizinhos se mobilizaram e chamaram o Siate (Serviço
Integrado de Atendimento ao Trauma em Emergência), mas ele não
apareceu. “Ninguém foi porque pensaram que era um trote”, conta
Lucilene, que, no dia, pegou o filho no colo, entrou no carro e
“voou” para o hospital. Lucas permaneceu 60 dias internado. Ele
entrou no hospital, carregado pela mãe e saiu sentado em uma cadeira
de rodas. “Eu era criança na época. Dei-me conta que a cadeira de
rodas seria a minha amiga, só aos nove anos”, lembra.
Lucas Fernando dos
Santos, hoje, tem apenas 13 anos, porém, mais parece um homem, não
apenas pelo fato de ser grande, mas também pela maturidade que
demonstra. A história e a determinação de Lucas fazem com que ele
nem chegue perto de ser um garoto comum.
Aos 11 anos conheceu
o basquete, depois o handebol, badminton, natação, atletismo, dança
e tênis de mesa. Em apenas sete meses já colecionava 30 medalhas. É
por esse e outros motivos que Lucas mais parece um supergaroto. “Eu
treino muito: quatro dias por semana, quatro horas por dia. Na minha
casa tem um painel de todos os meus horários. Tenho treinos de manhã
e à noite. À tarde eu estudo. Por tudo isso, minha vida é acordar
cedinho e dormir tardão”, conta orgulhoso.
Alguns médicos
disseram que Lucas só ficou na cadeira de rodas porque, na hora do
desespero, sua mãe o pegou no colo. No entanto, depois de uma
consulta no Hospital Sarah Kubitschek, em Brasília, isso foi
desmentido. “No começo minha mãe entrou em depressão, mas agora
ela me aceita e ainda tem orgulho de mim”, relata com um brilho nos
olhos.
Lucas está no 8º
ano do Colégio Mário Quintana, mora com a mãe Lucilene, o pai
Valdecir e mais três irmãos. Sempre foi muito dedicado aos estudos,
porém o preconceito fez o menino cair de novo. Na metade de 2013
parou os estudos, mas um ano depois reuniu todas as forças e voltou.
“Era muita piadinha na hora dos exercícios, do tipo: ‘ô Lucas,
faz isso com a perna, faz aquilo’. Eu respondia, mas quando chegava
em casa ficava pensando o porquê? Não aguentei o baque”, lamenta.
O garoto, que
enfrenta todos os dias os vilões da acessibilidade e do preconceito
sonha alto: “Eu quero ser um futuro paratleta da seleção
brasileira do parahandebol”, responde com firmeza.
O
menino sem limites
Lucas faz vários
esportes, tem uma vida bem agitada para um adolescente de 13 anos.
Porém, isso só foi possível depois de conhecer o Sem Limite, um
grupo dedicado aos cadeirantes que deixam a solidão para conviver
com novas pessoas. “Lá no grupo eu vejo que há pessoas com mais
deficiências, que não mexem os braços, só mexem o olho e têm
mais coragem do que eu. O grupo Sem Limite me ensina a viver”.
Todos os dias
existem barreiras para serem ultrapassadas, mas o adolescente não
perde o foco em busca do seu objetivo maior, que é de ser um campeão
brasileiro. Além da escassez de patrocinadores para os paratletas, a
cidade de Cascavel ainda está longe de ter 100% de acessibilidade. O
ônibus que Lucas e os outros colegas de esporte utilizam deixa-os em
uma avenida, obrigando-os a andar no meio da rua, em locais que não
há calçada, ou que há muitas árvores. “Quando passa um carro e
buzina, nos assustamos, vamos para o lado, morremos de medo. Só
mesmo quem está na cadeira, que sente na pele, sabe como é”.
Usar banheiros sem
adaptação, passar pelo meio-fio, andar no meio da rua, tudo em
cadeira de rodas, não é tarefa fácil. Mesmo assim, quando pergunto
se Lucas é uma pessoa feliz, ele responde de boca cheia: “Sem
dúvida nenhuma”. Hoje, Lucas percebe que o tiro retirou as forças
de suas pernas, mas lhe deu: dedicação, força de vontade e sede de
viver. “A cadeira me fez ter outra vida”.
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