Projeto Outra Pauta - Jornal Gazeta do Paraná
-Ai meu Deus, onde que eu estou?
-Estamos no Jornal vó, na Gazeta
-Ah, tá. Mas cadê o meu anel?
-Que anel vó?
-Aquele de ouro que eu tinha
-Ah está lá dentro guardado.
-Ah, ta bom então.
Essa aí em cima é a minha vó, Maria Aparecida Cardoso ou Vó Cida para os mais próximos, no auge das suas 83 primaveras bem vividas, a nossa octogenária apresenta os primeiros sintomas do Mal de Alzheimer. Em curtos períodos de tempo as perguntas se repetem várias vezes, as lembranças de acontecimentos passados são recorrentes – o anel de ouro ela tinha há pelo menos 40 anos e ainda é lembrado (ah, esse anel deu o que falar), assim como outros objetos que faziam parte de sua rotina- nomes são trocados, familiares são esquecidos e logo depois relembrados. – Ricardo, cadê o meu anel?
Em todo o mundo a doença atinge aproximadamente 35,6 milhões de pessoas e no Brasil 1,2 milhão. Quem não possui muitas informações sobre a doença acredita que os idosos que começam a apresentar os primeiros sintomas estão “caducando”, “-são sintomas da idade” e o mais pejorativo “ah ele está meio esclerosado”. – Onde que eu estou, Ricardo?
Há uns 10 anos vi uma propaganda sobre o filme que passaria no sábado, “Maria, filha do seu filho”, demorei a entender a sacada do autor, mas após muito “matutar” entendi a lógica, e hoje trouxe para essa matéria, mostrando um pouco dessas Marias, Pedros, Nilvas e tantos outros idosos que acabam virando filhos de seus filhos e quem sabe de seus netos, porque pai ou mãe é quem cuida.
A estudante de Direito, Flávia Sampaio, 34, mora em Cascavel há algum tempo e a sua vinda de Santa Catarina para o Oeste do Paraná se deu pela sua avó Maria, de 84 anos, que em 2011 foi diagnosticada com Alzheimer. Flávia relata que a doença da matriarca alterou toda a dinâmica familiar, uma vez que Dona Maria precisa de auxílio em várias atividades diárias. “Ela não pode cozinhar sozinha porque esquece as panelas no fogo e quando vai lavar roupa esfrega as mesmas peças várias vezes”. A idosa vence as barreiras do esquecimento através do cuidado de suas filhas, neta e bisneta. Flávia ressalta a importância da atenção com os idosos e repassa o belo exemplo recebido pela sua avó. “Na nossa família nos cuidamos dos idosos, minha avó cuidou da mãe dela e do meu avô e assim zelamos dela e passamos essa herança para as crianças”.
Amor compartilhado pelas redes
No mundo moderno é difícil quem nunca sentiu uma dorzinha e correu para a internet procurar o que poderia ser. Após muito vasculhar a rede você sai assustado acreditando que irá morrer em sete dias, porque os seus sintomas se parecem com doenças terríveis que o “Dr. Google” diagnosticou. Para que as pessoas não encontrassem apenas relatos sombrios e pouco motivadores sobre o Alzheimer, o Jornalista Fernando Aguzzoli, 22, resolveu criar no Facebook a página: Vovó Nilva, que com muito humor, descontração e amor traz as principais histórias da sua avó que enfrentava diariamente o Alzheimer. Hoje a ferramenta tem aproximadamente 65 mil curtidas e serve como instrumento de interação e ajuda entre os familiares de idosos com a doença.O Jornalista conta que um dos objetivos da página foi criar o seu próprio conteúdo sobre a doença na internet para aproximar os familiares que tem a mesma realidade. “Material pra te deixar com medo tem muito, mas conteúdo pra reforçar teus laços com o idoso portador da doença é muito raro. Precisamos justamente isso, lutar contra o abandono, mesmo enfrentando as dificuldades diárias de conviver com essa rotina”.
Ele conta que acreditava que a página faria muita diferença na vida de algumas pessoas, mas não fazia ideia que ela tomaria essas proporções. “Estou contente por estar, de alguma forma, fomentando esse debate e mostrando que o Brasil não está pronto, há muito que galgarmos para que possamos chegar tranquilos na nossa velhice”.
O gaúcho Fernando chamou à atenção do Brasil para a discussão do tema Alzheimer, após largar a faculdade de Filosofia em 2013 e a empresa recém-aberta para dedicar-se integralmente a sua avó Nilva Aguzzoli, que já era acometida pelos principais sintomas da doença. Com bom humor e paciência o jornalista deixou de ser o netinho da vó Nilva e assumiu a posição de Pai da própria avó. “Foi uma decisão complicada, mas foi o melhor caminho, tenho certeza. Quando um jovem decide ser pai de sua avó é uma batalha contra a velhice, acabamos vivendo todas as dificuldades de ser um idoso - com um obstáculo no caso dela - no Brasil.
Vovó Nilva deixou esse mundo no final de 2013, mas o seu legado ficou registrado no livro Quem, eu?. A obra relata um pouco da sua história e a relação com o Alzheimer, além de orientações de médicos, terapeutas e psicólogos e os diálogos afetuosos do neto com a sua avó.
O que é a doença?
O Mal de Alzheimer é uma doença degenerativa que causa a morte das células cerebrais, atinge principalmente as pessoas idosas e acarretando a perda das funções cognitivas (memória, orientação, linguagem e atenção). Porém se a doença for diagnosticada no início é possível retardar e dar melhor qualidade de vida para o paciente e seus familiares.
Sintomas
Os sintomas sempre são muito parecidos em todos os casos. Esquecimentos frequentes, lapsos de memória, repetição de atividades e em alguns casos de perguntas. Todos esses detalhes devem ser observados pelos familiares, no caso da Vovó Nilva as investigações começaram após ela apresentar uma confusão diária aos tomar os remédios para hipertensão. “Ela esquecia uns dias e nos outros tomava duas ou até três vezes, gerando náuseas e indisposição”, relata o jornalista.
Histórias que estão na Vovó Nilva
Um dia a vó acordou e saiu do quarto procurando alguma coisa, extremamente intrigada com o sumiço. Eu tava sentado na sala e fiquei quietinho, só olhando. Daqui a pouco...:
Eu: O que tu tá procurando vozinha?
Vó: O cachorrinho sumiu!
Eu: Nós não temos um cachorrinho, talvez seja por isso.
Vó: Não, aquele que eu trouxe!
Eu: De onde? Narnia? A senhora ACABOU de acordar.
Vó: Mas eu trouxe aquele cachorrinho lembra?
Eu: Não lembro, mas se te faz feliz vamos procurar. ... 3 minutos procurando ...
Eu: Vó, creio que na gaveta ele não esteja, não precisa abrir todas...
Vó: Sei la onde meteram esse gato.
Eu: OI? DESCULPE, A SENHORA FALOU GATO?
Vó: É, o gatinho que eu trouxe.
Eu: ERA CACHORRO HÁ ALGUNS MINUTOS! Ele morfou? evoluiu?
Vó: Ele o que? Não, é meu gatinho.
Eu: Ai, esquece o gato, vou fazer teu café. ...10 minutos....
Vó: Sabe aquele cachorrinho que meu pai me deu?
Eu: Não era gato?
Vó: Ah pu** que pariu já nem sei mais.
E assim começávamos o dia! Entre na onda, lembre-se que pra eles é realidade!
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Fernando com a Vovó Nilva |
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Dona Maria e Flávia |
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Texto de Ricardo Oliveira |
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